quarta-feira, 8 de abril de 2009

Dogville

DOGVILLE

Ambientado nos anos 30, o filme Dogville foi concebido totalmente em estúdio com utilização de poucos cenários e muitas demarcações no chão para indicar as casas dos personagens e a rua principal da pequena cidade localizada entre as montanhas rochosas. O diretor privilegiou o trabalho de atuação dos atores e utilizou recursos de luz para indicar as mudanças entre dia e noite e em pontos marcantes do filme. Organizada em um prólogo e nove capítulos, a obra utiliza uma linguagem pouco convencional para o cinema, incluindo subtitulações a cada capítulo do filme e indicação de elenco e equipe técnica somente no final. A trilha sonora é econômica, porém belíssima, e o silêncio perdura por quase todo o filme. Só é interrompido pelos diálogos marcantes e pela sonorização do abrir e fechar de portas invisíveis além dos sons dos motores dos automóveis e objetos utilizados pelos personagens. Algumas cenas possuem cortes abruptos que inicialmente confundem o expectador, mas com o desenrolar do drama fazem muitosentido. São 177 minutos densos e que propiciam ao expectadorsentimentos contraditórios e uma certa ansiedade para compreender o desfecho que cada personagem sofrerá. Tudo começa com a chegada de Grace (Nicole Kidman) uma linda mulher desconhecida que foge de gangsters e chega no pequeno lugarejo chamado Dogville. Lá ela encontra o escritor Tom Edison (Paul Bettany) que aparenta ser um tipo de líder dos moradores do lugar e um filósofo que analisa o tempo todo a maneira com que as pessoas se relacionam.Como Grace é uma fugitiva os moradores da cidade se reúnem para decidir se ela permanece ou não entre eles e após a argumentação de Tom Edison, eles decidem dar a Grace duas semanas para que ela mostre a todos, ser uma pessoa realmente confiável. Para ser aceita por todos, Grace inicia sua estadia ajudando todos os moradores da cidade entre eles, um senhor cego que vive sozinho e finge enxergar; uma dona de loja de produtos caros, que vive com suas filhas; uma mulher negra que cuida de sua filha com deficiência física; um casal cujo marido é considerado por todos como inferior intelectualmente por sempre perder no jogo de damas para Tom Edison e sua esposa sempre assediada pelos homens da cidade, uma família formada por várias crianças e um casal em que o homem é um agricultor de maçãs e a esposa uma educadora exigente; um homem que transporta cargas em seu pequeno caminhão e mora numa garagem; uma mulher que vive na igreja à espera de um padre que nunca chegará e que toca piano sem som e badala o sino da igreja, além do pai de Tom Edison um médico aposentado que acredita ser doente mas na verdade não tem nenhum tipo de enfermidade. Para cada morador Grace presta algum tipo de serviço, arrumando a casa, aconselhando ou tentando fazer o bem. E em troca de sua bondade os moradores não a denunciam a ninguém. O pacto perfeito entre oferta e procura, amizade e bem servir. Passam-se as duas semanas em que ela estava em observação por todos os moradores e numa reunião eles decidem que ela pode continuar em Dogville. Grace se sente acolhida e acredita ter feito novos amigos numa cidade perfeita onde ela tem a missão de fazer as coisas que ainda não foram feitas por ninguém, mas que com certeza precisam ser iniciadas. A polícia aparece no local procurando a moça desaparecida e com medo da denúncia dos moradores, Grace se submete cada vez mais a servi-los e a cada denúncia as pessoas vão aumentando o seu trabalho e diminuindo seu salário. Os pedidos são gradativamente transformados em exigências e as relações outrora tão afetuosas se transformaram em violência, abusos e mentiras. Os pobres moradores de Dogville mostraram seus dentes e fizeram Grace transitar por caminhos de medo, sofrimento, humilhação e subordinação. Não havia mais fim para o pagamento do silêncio e a subserviência humana era posta em seulimite. Até mesmo Tom Edison por quem Grace acreditava ter umsentimento verdadeiro de amizade e amor, trocou a verdade pela conveniência de manter tudo como estava e manteve a sua liderança sobre aquelas criaturas que mais pareciam cães atrás de seus ossos do que seres humanos com valores éticos. A triste história de Dogville mostra toda a hipocrisia social onde o ser humano vaidoso, substitui o altruísmo pela barganha mesquinha, em que os sentimentos de crueldade, de frustração, de medo, de inveja e de falsidade perpetuam a desvalorização das relações humanas verdadeiras por trocas materiais e sentimentais que não condizem com o sentido da vida. Dogville é uma representação micro-social do que acontece em nosso mundo, pelo abuso de poder e pela manutenção de dogmas e valores, que há muito tempo obscurecem a visão humana para a essência do viver em sociedade: cultivar a amizade e o respeito, sem exigir trocas, sem fazer cobranças e principalmente sem esperar pagamentos.

REFERÊNCIA FILMOGRÁFICA

DOGVILLE. Direção de Lars Von Trier. Lions Gate Enterteinment and California Filmes. Dinamarca: 2003. 1DVD (177 min.), color, legendado.

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